segunda-feira, fevereiro 25, 2008

Eu vi

Nova semana, um novo texto, dos antigos também. Uma coisa particularmente fantástica de textos antigos é lembrar de como alguns sentimentos e sensações foram tão fortes e agora estão diluidos pelo tempo.

Esse tipo de nostalgia reforça a idéia de que não há dor que não vá embora, infelizmente também não existe alegria que seja eterna. Tá triste? Vai passar. Tá alegre, curta com intensidade.

Vai um mini-bônus nessa semana também, coisa novíssima, direcionada a uma pessoa (em) especial.

"Não vejo a hora de perder tempo com você."

*****

Eu vi a fome
daquele que come sua fatia de pão, olha em volta, não vê outra e percebe triste que a fome continua

Eu vi a solidão
de alguem que olhou ao redor no fim do dia e não viu alguem para conversar,
que viu na agenda números para quem não poderia ligar e chorou, sozinho

Eu vi a decepção
dos que esperavam mais, queriam mais, lutaram por mais, e mesmo fazendo melhor que todos os demais não conseguiram e se amargaram

Eu vi a dor
de quem a sente a cada instante, fisica, incessante e vê a morte como único anestésico eficaz

Eu vi a esperança
da sujeita que teve um começo novo, uma folha em branco para redesenhar sua história, sem cruzes nem remorsos que te prendessem ao chão

Eu vi a raiva
de quem a sentiu por burrice ou omissão, e por incompetência própria se deu uma cruz para carregar

Eu vi o amor
de alguem que por coragem ou medo derrubou suas barreiras, se jogou de braços abertos e encontrou outros braços gostosos igualmente abertos do outro lado

Eu vi a satisfação
da pessoa que dorme feliz num colo gostoso após toneladas de doces feitos com carinho

Eu vejo a alegria
De alguem que finalmente consegue colocar no papel sentimentos que não são só dele, mas que já foram sentidos como se fossem

segunda-feira, fevereiro 18, 2008

Pois que venham...

Depois de uma pequena sessão nostalgia do texto passado, trago agora um texto mais novo, fumegando e com a cobertura escorrendo pelas bordas. Portanto, sirvam-se e se lambuzem. Só cuidado para não se queimarem!

Em tempo! Vocês por acaso viram essa reportagem?

*****

"Venham, malditos fantasmas do passado!
Não temo seus calafrios e memórias pois estou armado com a mais afiada espada e protegido pelo mais rígido, mesmo calejado, escudo!
Dragões de outrora ultrapassados pelo longo tempo, as feridas que causaram ardem, mas não para sempre!
Cada chaga de meu corpo é a lembrança de uma dor que me empurra sem hesitação para vosso fim.
Ignóbeis que expuseram as entranhas, de quem me dá firmeza para enfrentá-los, temam a minha ira, pois ela há de os expurgar!
Imbecís que não souberam...
Espere... Não!
Meu escudo! Por que me recusa? Não fuja! Para onde vai? O que houve? Por que?
...
Sem meu escudo sou dilacerado...
Meu braço que brandia a espada, agora fosca, de maneira majestosa não vê motivo para erguê-la e incutir medo no coração dessas bestas.
Sem reagir vejo meu sangue jorrar com facilidade.
Por que?
A dor de minhas víceras espalhadas não me incomoda.
Não entendo.
Ouço o barulho de meus ossos moendo, de minha carne partindo, agora isso não importa.
Como?
Sem muita força, me arrasto para longe.
A terra dura, se esfregando em minha carne viva, me lembra outras guerras...
...que não me mataram...
...que afiaram minha espada...
...que endureceram meu couro...
Mais longe da batalha, com o canto de olho, vejo meu antigo escudo, acuado.
A visão, mesmo embaralha pela fraqueza, vê que enfrentava batalhas também.
Pede o meu braço.
Com medo.
O acolho.
Com medo.
Tê-lo no meu braço me dá força.
Seguro com força sem precedentes no escudo que parece responder se agarrando a mim.
Me levanto.
Da convicção do retorno do meu escudo, tiro a força para empunhar como nunca minha lamina, que reflete o sol no meu peito aquecido.
Vejo em que estado me encontro, ensanguentado.
Vejo meu escudo, demolido.
Vejo nossos alvos. Agora maiores, mais próximos, mais numerosos.
Pois que venham...
Pois que venham..."

terça-feira, fevereiro 12, 2008

As cores do som

Ah carnaval se foi e já dá para ver a mudança no ritmo da vida.
A nova semana veio e com ela um novo texto meio antigo. Digo novo pois nunca o publiquei, digo velho, pois inspirei em um texto antigo que escrevi anos atrás e digo meio pois foi reescrito, pois assim como muitos textos meus, o tempo e as mudanças de lar o levaram.

*****

"Tomava o seu lanche da manhã... Devagar, engolia em pequenos pedaços que desciam queimando.
Misturava o café com o leite e lembrava como eram como seus corpos nus se misturando numa gostosa dança sem pressa de acabar.
Sentia falta de sua lindinha ou "vagabunda" como sua mãe preferia chamar.
Não via com seus olhos, não sentia com sua pele, não amava com seu coração.
Como a mesma moeda parecia ter lados tão diferentes? E como o ódio podia ser acesso por faíscas tão idiotas...
Por medo, abriu mão de sua face, de seus seios.
Pinto frouxo em granja de galinha gorda, a deixou ir.
Pelo menos de onde seus braços pudessem alcançar.
Pois ela ainda estava ao alcance dos sonhos, até que outra vagabunda venha preenchê-los."

quinta-feira, fevereiro 07, 2008

Sem nome ainda, parte final!

Passado o carnaval o Brasil supostamente volta a funcionar.
Muita água salgada, muito sol, muito descanço e lugares que quero voltar e conhecer com mais calma futuramente.
Segue no embalo a última parte desse conto, a finalização do primeiro de muitos que virão.
Valeu pelo apoio, críticas e elogios, algumas das críticas eu não consegui aplicar ainda, mas estão anotadas com carinho.
Um grande abraço e até a próxima!

*****

"Um dia ao sair do 'A caixa', ligeiramente embriagado, não foi pegar o costumeiro ônibus. Resolveu seguir um caminho diferente, queria andar um pouco. Sua garganta doia, como que se as palavras que ficaram lá resolvessem se rebelar.
Os passos eram vagarosos, observava as pessoas, como conseguiam viver? Os risos pareciam falsos, os abraços falsos, os beijos falsos.
Seus pés o foram levando até uma rua larga. O sol não marcava presença havia tempos e a luz dos postes não o substituia devidamente. De longe não percebia, mas de perto via-se que era uma ponte.
Resolveu seguir para a beirada da ponte. Engraçado não lembrar desse lugar.
Atravessou a proteção da ponte para ver melhor, o vento era delicioso.
Olhou para baixo. Era uma respeitável altura, de longe parecia um lugar de paz, as várias pedras eram abraçadas pela insistente água. Tão diferentes e ainda assim juntas.
Soltou os braços, os mesmos levavam os venenos a sua boca, os constantes relatórios sem sentido, os abraços a tempos esquecidos, a carteira ao bolso, a moça para mais perto e a vida para mais longe.
E sorriu, enquanto as pedras pareciam cada vez maiores e o vento cada vez mais rapido.
E tudo ficou escuro.
Miraculosamente, seu telefone sobreviveu e tocou.
Era 'ela'..."